sábado, 13 de fevereiro de 2010

A Face Perfeita

Quando ela se mudou pra cidade nova, tudo parecia muito velho. As pessoas velhas eram muito velhas, e as pessoas novas pensavam como pessoas velhas. E tudo era muito calmo, tudo muito organizado. Tudo tinha seu lugar. Mas qual é o lugar de uma pessoa. Nos condicionamos a acreditar que uma pessoa não pertence a um lugar. Aprendemos a acreditar que uma pessoa é livre, que tem o direito de ir e vir. Mas, e quando você não sabe a onde pertence, qual é o lugar que pode chamar de lar. O lugar em que pode confiar se jogar de olhos fechados.

Ela nunca teve um lar, nunca teve estrutura. O pai vivia de empregos que duravam muito menos do que os empregos dos pais das amigas que ela gostaria de ter. A mãe acompanhava o pai, coberta pela submissão que envergonhava a única filha. Ela jurava para si mesmo todos os dias que nunca seguiria o exemplo de nenhum dos dois. Não seria uma aventureira que sempre se decepcionaria com seus sonhos. Não seria uma submissa que abaixava a cabeça para não ter que discutir.

Sonhos inúteis só serve para os fracos. Submissão também.

Desde pequena estava acostumada a não ter lar... Era uma planta sem raiz, e talvez por isso era tão difícil crescer, não tinha chão. Se habituou a não criar nenhum tipo de vínculo, a não ser simpática, a afastar as pessoas. Ninguem duraria pra sempre. Principalmente no caso dela. Era sempre uma questão de tempo para o pai arrumar um novo sonho e partir para uma outra cidade qualquer, deixando tudo para trás precocemente. As páginas da vida dela eram viradas com violência. Sem dó.

Isso, é claro, não a tornava uma pessoa pior. De certo a tornava melhor. Mais forte, mais independente. Mias sozinha também, é verdade. Mas com isso ela já estava acostumada.

E novamente as coisas recomeçariam. Ela iria para uma nova cidade. Talvez a menor em que já morara. A casa era bonita, a vizinhança também. Era como estar num filme americano de bom gosto, onde tudo tinha um ar de perfeição e os vizinhos levavam tortas de amora que representavam as boas vindas. Era hospitaleiro. Quase comovente. Mas não ia durar muito, ela sabia.

As malas estavam quase que completamente vazias, as coisas de menos importância, jogadas as pressas na mudança repentina ainda estavam por lá. Mas podiam esperar para serem guardadas. Pela janela ainda sem cortinas, ela podia ver o mundo acontecer lá fora. Na vizinhança as crianças perfeitas brincavam sem se sujar, aproveitavam a ultima semana de férias. Aproveitavam o verão sem suar.
A calma daquele lugar irritava.

Lentamente foi andando pelo quarto, avaliando o trabalho feito. estou pegando experiência nessa coisa de mudança pensou, o quarto estava como tinha que ser. Só faltava as cortinas. Ela viveria melhor se não visse a rua.

Se deixou cair na cama. Se deixou chorar por algum tempo, se lamuriar mais uma vez. Nada seria mais justo. Ela merecia chorar. Merecia ter seu momento de fraqueza, porque, no momento de fraqueza é que podia ser ela mesma. Podia mostrar quem realmente era, podia parar de fingir toda essa força e maturidade que tinha que ter pra abidcar dos amigos que tinha conseguido, de todas as possibilidadeas que deixou para trás.

Vida nova...
O final de semana ia ser longo, e ela não conseguia parar de pensar que depois dele viria as aulas. E que ela não podia deixar de evitar ser "a garota nova".
Mais uma vez.

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